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Vereadores reúnem profissionais para discutir saúde dos trabalhadores da enfermagem

22.03.2019 · 12:00 · Audiência Pública

A saúde dos trabalhadores da enfermagem em Campo Grande foi tema de audiência pública, nesta sexta-feira (22), na Câmara Municipal. O debate foi convocado pela Comissão Permanente de Saúde da Casa de Leis, por proposição do vereador Fritz, que também é enfermeiro. Valorização profissional, melhoria das condições de trabalho e piso salarial estiveram entre os assuntos debatidos.

“Os profissionais de enfermagem não têm nenhuma segurança nos estabelecimentos de saúde. Infelizmente, as instituições, hoje, não têm mais aquela visão de filantropia. Sabemos também de inúmeros acidentes, principalmente ocasionados por perfurocortantes. O que acarreta isso? Jornada de trabalho. Sair de um plantão de 12 horas e fazer mais 6 em outra instituição. Ninguém consegue produzir assim”, afirmou o presidente do Siems (Sindicato dos Trabalhadores na Área de Enfermagem de Mato Grosso do Sul), Lázaro Santana.

Há ainda índice elevado de profissionais afastados por doenças psiquiatras, tema que também foi abordado no debate. A audiência contou ainda com a palestras de profissionais de referência na área, a exemplo da médica psiquiatra Silvia Rodrigues Jardim, doutora em Psiquiatria e Saúde Mental, e de Lúcia Rotenberg, doutora em Psicologia. Ambas têm várias pesquisas relacionadas ao trabalhador da saúde.     

“De quem estamos cuidando? Que essa pergunta seja formulada de todos os lados da sociedade: que a enfermagem pergunte, a administração, os políticos, secretários. Ao defender o trabalho da enfermagem, defendemos a saúde de todos, a saúde da cidade. A primeira relação entre depressão e trabalho tem a ver com desemprego. O desemprego é uma forma de relação com o mundo do trabalho. Se tem algo que está associado ao sofrimento mental relacionado ao trabalho, é o desemprego, e a depressão confirma isso. Devemos melhorar as condições de trabalho e de vida, para aqueles que nos atendam, trabalhem melhor. É nessa interface que está a saúde do trabalho”, afirmou Silvia Jardim.

Já segundo Lúcia Rotemberg, a enfermagem passa por uma crise em todo o mundo. “A enfermeira não quer mais ser enfermeira. São elementos que já existem em todo o mundo. Falamos de pessoas que trabalham com indivíduos doentes. A única exceção é a maternidade. São pessoas que tem um tempo de trabalho diferente da maioria das outras pessoas: fazem plantões, trabalham a noite, aos finais de semana. Um trabalho que todos precisamos. Existem vários tipos de problemas de saúde, mentais e físicos, associados ao trabalho em enfermagem”, apontou.

O debate contou ainda com a participação de profissionais da enfermagem, representantes de sindicatos, conselhos e associações da categoria, e pesquisadores de universidades. Para o vereador Valdir Gomes, no entanto, representantes do Executivo também deveriam participar da audiência.

“A saúde está capengando por culpa de gestão, não é só o salário. Tenho ido nos postos e não podemos aceitar o mau atendimento com o servidor. Tenho visto o esforço de todos. Queria que convocasse outra audiência, para que, se não vier o secretário, que venha a adjunta. Quero ouvir a situação que estão passando, posto por posto, UPA por UPA. A gente percebe o anseio dos representantes da categoria”, afirmou.

Segundo o vereador Eduardo Cury, “o trabalhador da saúde está muito doente”. “Essa emergência se faz necessária. Seja ele enfermeiro, técnico, administrativo, até o próprio segurança ou guarda: todos estamos doentes. Sofremos uma carga extremamente negativa ao executarmos nosso trabalho. O trabalho do profissional de saúde é o anteparo de todas as angústias. Tudo que existe de ruim é culpa do médico, do enfermeiro, do técnico. Não temos descanso. Nossa jornada não é de 30 ou 40 horas. Ainda hoje, faço jornada de 80 horas. A população não tem esse conhecimento. Nós ganhamos muito pouco. O plantão, na verdade, é que formou minha família. Ninguém está cuidando do nosso estado mental, das agressões que sofremos”, analisou.

Já o presidente do Sinte (Sindicato de Enfermagem do Município de Campo, Ângelo Evaldo de Macedo, reclamou a falta de pessoal, que, segundo ele, reflete diretamente no trabalho dos enfermeiros. “O trabalhador precisa estar minimamente em condições de poder proporcionar cuidados àquele que o procura. Enfrentamos problemas seríssimos dentro da nossa profissão. Relacionados ao RH, bem diminuído, e com algumas articulações, buscando e oferecendo mais serviços à população sem você ter RH suficiente pra isso. Enfrentamos problemas com condições de trabalho, temos um quadro de profissional reduzido e não temos condições de exercer a atividade muitas vezes porque não temos materiais para tanto. Sou plantonista e há muito tempo estamos sem agulha para fazer aspiração. Todos nós queremos proporcionar ao usuário o melhor atendimento possível. Mas isso não se resume ao fato de eu estar lá como profissional. É preciso que a gestão esteja lá”, afirmou.

Para Arminda Rezende de Pádua Del Corona, doutora em Cultura de Segurança do Paciente pela Universidade de São Paulo, o profissional não consegue realizar um trabalho com respaldo. “Temos que chamar realmente a área patronal para mostrar a situação em que a categoria se encontra. Vejo que os patrões, público e privado, devem estar juntos. Em Mato Grosso do Sul, a enfermagem ainda é muito doméstica na questão do exercício profissional. Continua dando uma enfermagem com estigma de que tem um menor valor. Isso só vai ser revertido quando tivermos uma enfermagem sistematizada, trabalhada com ciência e evidência, que vai para a linha de frente. Se sindicato tem poder para isso, está faltando ação, de conselho também. Enquanto tivermos essa enfermagem, a sociedade vai enxergá-la de menor valia”, afirmou.

Segundo a vereadora Enfermeira Cida Amaral, a enfermagem não é desunida. “Agradeço a todos que, de uma forma ou de outra, acompanhou nosso trabalho. A enfermagem não é desunida, mas não tem tempo para se reunir e conversar. Precisamos levar isso para as escolas. Tenho várias leis que temos que ir na escola, fazer a diferença. Vou me aposentar enfermeira brigando por 30 horas, por piso salarial, mas ainda sou professora de muitos que ainda entrarão na luta”, afirmou.

O vereador Fritz propôs, no final da audiência, a criação de um grupo intersetorial para lutar pelo piso salarial da categoria, bem como a jornada de 40 horas semanais. “Os sindicatos ainda devem cobrar dos patrões o que tem sido feito pela saúde do trabalhador. Gostaria, também, que as associações trabalhassem na fomentação de pesquisas e discussões referentes ao tema, mas que não ficassem no eixo dos debates. Que pudéssemos ampliar essas discussões”, considerou.

Jeozadaque Garcia
Assessoria de Imprensa da Câmara Municipal